quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

Um ano perdido para a Hypermarcas

Com vendas e lucro em queda, a Hypermarcas se reestrutura para voltar a crescer - e não frustrar as expectativas dos investidores novamente em 2012.

São Paulo - "Notícia ruim, volte amanhã. Notícia boa, a qualquer hora.” A mensagem está pregada na porta da sala de Cláudio Bergamo, diretor-presidente da Hypermarcas, uma das maiores empresas de consumo de capital nacional. Por muito tempo, Bergamo não precisou se preocupar com a primeira parte da mensagem.

Na Hypermarcas, pouca gente tinha motivos para levar-lhe notícias ruins. Com uma série de 19 aquisições desde sua estreia na bolsa, em abril de 2008, a empresa cresceu num ritmo de até 60% por ano e faturou 3,1 bilhões de reais em 2010. As boas notícias pareciam chegar a toda hora.


Agora, com dificuldades em fazer um emaranhado de marcas de setores como alimentos, remédios e produtos de limpeza funcionar de maneira eficiente, a Hypermarcas vive um momento bem diferente — com resultados em queda.

No primeiro semestre, o lucro líquido foi de 86,5 milhões de reais, 13,6% menos em relação ao mesmo período do ano passado. Segundo analistas, os dados do terceiro trimestre esperados para o dia 7 de novembro não são melhores.

As vendas devem cair até 4,4%, sem contar o efeito de aquisições. O prejuízo anual, resultante do impacto da valorização do dólar na dívida, deve chegar a 100 milhões de reais. O Goldman Sachs prevê crescimento zero — isso mesmo, zero — para 2011, no cálculo sem o efeito das aquisições.

Ninguém mais do que Bergamo está sendo cobrado por boas notícias pelos investidores da Hypermarcas. “Este é um ano de transição”, diz ele. “Precisamos desacelerar para pôr em ordem o que compramos e voltar a crescer em 2012.”


O revés determinou a mudança na estrutura de poder da Hypermarcas, compartilhado por dois executivos desde 2008, quando o empresário goiano João Alves de Queiroz Filho, o Júnior, abriu o capital da companhia.

Por uma década, Bergamo — um ex-consultor da McKinsey — comandou todas as áreas da empresa, à exceção da comercial. À frente das vendas de todos os produtos estava Nelson Mello, parceiro de Júnior há mais de três décadas e um dos responsáveis pelo crescimento da antiga Arisco, nos anos 80 e 90.

Num desenho de organização atípico, Bergamo e Mello dividiram o posto de principal executivo até agosto, quando a Hypermarcas foi dividida em duas unidades de negócios. Na nova configuração, Mello passou a responder apenas pela divisão de consumo, que deverá ficar menor em breve.
Com a decisão de vender marcas menos rentáveis, como Etti e Assolan, ainda neste ano, a divisão de consumo estará restrita a produtos de cuidado pessoal, como Monange e Avanço, e passará a representar 42% das vendas (até julho equivalia a 46%).


Todo o restante virá da área farmacêutica — a mais rentável da companhia —, que em outubro passou a ser comandada por Luiz Eduardo Violland, ex-presidente da farmacêutica Nycomed no Brasil.

Acima de Violland e Mello, Bergamo passou a comandar as duas divisões. Segundo executivos próximos, Bergamo ganhou poder ao defender rentabilidade no lugar de crescimento acelerado, uma bandeira de Mello.  “A opção pela rentabilidade foi consensual”, diz Bergamo. “Nelson e eu sempre trabalhamos muito bem juntos.” 

Os problemas decorrentes de manter produtos tão diversos como molho de tomate e analgésicos sob a mesma orientação comercial tornaram-se evidentes neste ano. A complexidade aumentou após a compra do laboratório Mantecorp por 2,5 bilhões de reais, em dezembro.

O negócio fez a área de medicamentos da Hypermarcas ficar  40% maior. Com a política de manter descontos e prazos de até 90 dias na venda a distribuidores e atacadistas, a empresa fechou 2010 com crescimento orgânico de 17% nas vendas. Os estímulos, no entanto, fizeram os clientes encher os estoques a ponto de alguns simplesmente pararem de comprar.


Para medicamentos, o caso foi mais grave — já que o consumidor final não reage a descontos em remédios como em outras categorias de consumo. “A demanda nesse setor é orientada pela necessidade e não pela oportunidade”, diz um alto executivo de uma concorrente.

Na rota de correção, a Hypermarcas reduziu prazos e aumentou preços em abril. As vendas caíram ainda mais. “A medida traz perda momentânea, mas vamos ganhar margens”, diz Bergamo. Para conter custos, o ritmo de lançamentos também caiu — de 360 itens em 2010 para 250 neste ano.
À medida que desacelera o crescimento, uma das prioridades é avançar na integração das equipes de vendas. Até agora, parte delas manteve-se quase intocada, com a estrutura original das companhias compradas. “Por ser muito sensível, levamos de 12 a 18 meses após a compra para integrar a área comercial”, afirma Bergamo.

Em toda a companhia, o número de equipes deve ser reduzido de 12 para 8 neste ano. Na divisão de higiene e beleza, a reestruturação reduziu as equipes pela metade no primeiro semestre — de oito para quatro (praticamente sem reduzir o grupo de  cerca de 400 vendedores).

“Antes recebíamos até 30 vendedores diferentes da Hypermarcas, hoje recebemos metade disso”, diz Walter Faria, presidente do Martins, maior atacadista do país.


Alguns times foram mantidos independentes, como o das fraldas Sapeka, pela peculiaridade da distribuição pulverizada voltada para o público de classe C. Com a integração, a empresa já obteve ganhos de sinergia de 217 milhões de reais no primeiro semestre, 84% do que espera para 2011. 


Após frustrar investidores com expectativas não cumpridas — em março, a Hypermarcas previa crescimento de 15% neste ano —, Bergamo está mais cauteloso para dar previsões. Mas afirma que os resultados aparecerão em 2012. O ganho imediato virá com a venda de marcas.

Até o fechamento desta edição, a empresa negociava com a Flora, dos mesmos donos do frigorífico JBS, a venda de marcas como Assolan e Assim por cerca de 250 milhões de reais. (Reckitt Benckiser, Ceras Johnson e Química Amparo também estavam no páreo.)


Em estágio menos avançado, a Etti é disputada por Bunge e pela americana McCormick, por 300 milhões de reais. “A venda permitirá à Hypermarcas focar em segmentos mais rentáveis e aumentar o valor de mercado”, diz Daniela Bretthauer, analista do banco Raymond James.

À espera de boas­ notícias, os investidores recuaram. As ações da Hypermarcas desvalorizaram 59% desde janeiro — a maior queda do Ibovespa no período.

Fonte: Exame

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