O Brasil tenta avançar no campo da inovação.
Para isso, lança mão das suas armas para vencer a falta de cultura que
ainda existe em torno desse tema e para aproveitar melhor os
instrumentos disponíveis para apoiar as estratégias das empresas
Desafiados a dar um passo a frente em termos de inovação, as empresas
e instituições públicas brasileiras acertam os ponteiros para garantir
que o País aproveite o bom momento econômico e posicione os seus
produtos e serviços de forma mais competitiva. A boa notícia é que
recursos estão disponíveis, há algum tempo, através de financiamentos e
benefícios fiscais estaduais e federais. A má é que as empresas ainda
não acordaram para essas possibilidades.
Existem cerca de 50
instrumentos que podem ser acessados junto a instituições como
Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), Banco Nacional de
Desenvolvimento Econômico e Social (Bndes), Financiadora de Estudos e
Projetos (Finep), Sebrae e agências de amparo à pesquisa. Mas são poucos
os empresários que costumam ir atrás.
A Lei 11.196,
conhecida como Lei do Bem, existe desde 2005 e tem como grande vantagem o
fato de ser um incentivo fiscal, como o abatimento de Imposto de Renda e
Contribuição Social, que pode ser tomado de forma automática. Mas, no
ano passado, das 100 mil empresas brasileiras, apenas 653 utilizaram
esse instrumento.
“O Brasil tem hoje uma boa base instalada de apoio
à inovação através de incentivos e marcos regulatórios, e com níveis
diferenciados de burocracia. O que falta é proatividade da iniciativa
privada para acessá-los”, comenta o vice-presidente da Associação
Nacional de Pesquisa e Desenvolvimento das Empresas Inovadoras (Anpei),
Guilherme Marco de Lima.
Os motivos que fazem com que os
empresários ainda atuem de forma tímida nessa seara são muitos e
poderiam originar uma tese. Mas tudo começa pela falta de uma cultura do
risco no Brasil. Em muitas companhias, a inovação ainda não é aceita
como um projeto de médio e longo prazo e, sim, como uma iniciativa que
deve ser capaz de trazer resultados imediatos.
Mais
especificamente sobre o acesso a instrumentos de apoio a essa prática,
pesa a falta de conhecimento e o medo de perder muito tempo em busca das
documentações necessárias para comprovar que a empresa é inovadora e,
assim, poder usufruir dos benefícios. “As burocracias existem, mas isso é
apenas uma barreira, não um impeditivo para as empresas buscarem a
diferenciação”, alerta Lima.
O gerente sênior
executivo de Consultoria Tributária da Ernst & Young Terco no Rio
Grande do Sul, Paulo Corazza, explica que o que se faz é uma consulta
prévia para verificar aderência do projeto às linhas disponíveis. E,
apenas em uma segunda etapa, quando o benefício já está confirmado, é
que a empresa precisa sair em busca de documentos e das comprovações. “O
início é mais difícil, mas depois os profissionais se acostumam com a
dinâmica e tudo fica mais natural”, diz. A Ernst & Young Terco
possui clientes no Estado para os quais presta consultoria nessa área:
identifica as oportunidades, elabora os projetos e faz todo
acompanhamento até a aprovação.
A necessidade de comprovar
que merece receber o incentivo faz parte do jogo. O Brasil, inclusive,
possui uma metodologia de oferta de incentivo fiscal à inovação
semelhante à de países como os Estados Unidos. A diferença é o montante
que as nações desenvolvidas costumam direcionar para essa área e a
maturidade acerca do tema, inclusive no que se refere à inserção das
pequenas e médias.
Muitas vezes, os valores mínimos que podem
ser financiados são muito altos para uma operação de menor porte. Em
outros casos, como no da Lei do Bem, as maiores beneficiadas são as
companhias optantes do lucro real. “As grandes já estão bem acostumadas
com instrumentos da Finep e do Bndes, mas para as de menor porte
precisamos avançar na criação de um ambiente favorável” diz o secretário
de Inovação do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio
Exterior, Nelson Fujimoto.
Keko aposta no Pró-Inovação e na Lei do Bem
Do
início de 2010 e até o final de 2012, a Keko terá lançado de 60 a 80
novos produtos no mercado, todos acessórios desenvolvidos pela empresa
gaúcha para o segmento de veículos automotores. O desafio é criar
produtos que atendam às necessidades do mercado, especialmente dos
segmentos que estão crescendo impulsionados pela expansão da classe
média.
Fundamental para garantir a competitividade, a
velocidade de lançamentos depende cada vez mais da capacidade de a
empresa inovar. “Não somos produtores de peças e, sim, de
personalização. E isso só é possível com muita pesquisa e
desenvolvimento”, observa o diretor-administrativo-financeiro da Keko,
Volnei Ebertz. Segundo ele, a empresa sabe que se não acompanhar essas
mudanças, acabará ficando para trás.
Por isso mesmo, a Keko
vem, há alguns anos, estudando as oportunidades que existem nos projetos
de incentivo à inovação no Brasil, através de instrumentos estaduais e
federais. Com o apoio de uma consultoria jurídica, a Keko foi a primeira
a aderir ao Pró-Inovação no Rio Grande do Sul, regulamentação da Lei
Estadual de Inovação voltado para o incentivo de atividades inovadoras
no ambiente produtivo. A lei garante um desconto de até 75% do Imposto
sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) gerado pelas novas
ideias.
O contrato foi assinado no final do ano passado e a
expectativa é começar a usufruir este ano. A projeção da Keko é que 1%
do faturamento retorne via incentivo. O mesmo percentual é esperado com a
Lei do Bem, outro instrumento que oferece vantagens fiscais para as
companhias que apostam na inovação.
Já quando o assunto é
aumentar a capacidade de investimento, a Keko conta atualmente com R$ 15
milhões junto a Financiadora de Estudos e Projetos (Finep). Esses
recursos fazem parte do plano estratégico para os próximos cinco anos da
empresa - de 2012 a 2016 – e que estão sendo repassados com o aval do
Badesul. A empresa possui um terço deste valor em mãos e até o final do
ano terá a totalidade.
Ebertz comenta que o caminho para
acessar o crédito junto a Finep não é dos mais simples, mas a parceria
com o Badesul tem ajudado nesse meio de campo. “O banco ajuda a
viabilizar que as empresas consigam acesso ao recurso na medida em que
entra como o garantidor junto a Finep”, destaca.
O gestor
comenta que esse é um recurso diferenciado, que permite que a Keko possa
antecipar um movimento estratégico e lançar produtos diferenciados em
um tempo menor. A empresa deve fechar esse ano com faturamento de R$ 120
milhões e, até 2016, a meta é chegar a R$ 250 milhões. Esse prazo deve
ser encurtado em dois anos a partir desses recursos em inovação. “O
nosso objetivo é manter um ciclo contínuo de investimento em novos
produtos”, diz.
Medo de arriscar impede avanços
Um
dos principais gargalos que o Brasil enfrenta, quando o assunto é a
inovação, é a falta de uma melhor conexão entre o conhecimento de alto
nível que é produzido dentro das instituições de ensino nacionais e a
sua transferência para a iniciativa privada.
Prova disso é
que o Brasil está em 13º na produção de artigos científicos sobre
descobertas feitas no meio acadêmico, mas ocupa a 24º colocação entre os
países mais inovadores do mundo. “Ainda falta tempo, visão e cultura
para que o conhecimento gerado dentro da universidade possa ser inserido
dentro do processo produtivo”, comenta o secretário da Ciência,
Tecnologia e Inovação (SCTI), Cleber Prodanov.
De uma forma
geral, empresas, poder público e até mesmo as universidades ainda não
despertaram para a importância desse tema. Perceber a necessidade de
fazer um trabalho de base bem feito, capaz de levar a processos e
produtos diferenciados, é o passo esperado para aumentar a
competitividade do País.
Especialistas defendem ainda que as
empresas aumentem os recursos voltados para o financiamento da inovação,
passando a atuar junto com o governo. Atualmente, cerca de 1,19% do
Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil é investido em Pesquisa e
Desenvolvimento (P&D). Estima-se que 60% desse total sejam recursos
governamentais.
Nos países membros da Organização para a
Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), o índice é de 2,5%. “A
inovação tem que ser um pilar de negócio das empresas. Só assim
conseguiremos competir globalmente e sobreviver localmente”, relata o
vice-presidente da Associação Nacional de Pesquisa e Desenvolvimento das
Empresas Inovadoras (Anpei), Guilherme Marco de Lima. Mas alguns sinais
começam a mostrar que existe uma evolução em curso nesse sentido. Até
bem recentemente, o País tinha mais recursos disponíveis para inovação
em órgãos como a Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), do que
interessados.
Boa parte dos milhões reservados para o mercado
investir em Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) ficava parada nos
cofres da entidade. Neste ano, a história já é diferente. A Finep, por
exemplo, tem uma carteira de R$ 14 bilhões para financiamento de
projetos e, ainda assim, existem mais interessados que do que dinheiro
disponível.
Isso não quer dizer que a falta de atenção das
empresas seja algo completamente resolvido. Tanto que, no Rio Grande do
Sul, o Pró-Inovação, uma regulamentação da Lei Estadual de Inovação que
oferece benefícios fiscais para as empresas que investirem em P&D,
está com uma procura abaixo do projetado.
Atualmente, pouco
mais de 20 players estão buscando esse benefício. Não era isso que o
secretário da SCTI tinha em mente quando sentou à mesa para negociar os
percentuais de benefícios com a Secretaria da Fazenda. “Eu esperava pelo
menos 200 pedidos até o final do ano”, admite Prodanov.
Como
tem capacidade para operar com mais empresas, a SCTI acredita que, com
mais divulgação e com os primeiros cases de sucesso aparecendo, o
programa possa deslanchar. “O Pró-Inovação é uma regulamentação
relativamente nova, e a tendência é que com o tempo se torne mais
conhecida das empresas”, relata o gerente sênior
executivo de Consultoria Tributária da Ernst & Young Terco no Rio
Grande do Sul, Paulo Corazza. Situação similar já aconteceu com outros
instrumentos no Brasil, como a Lei do Bem, que demorou para começar a
ser acessada pelas empresas.
Fonte: Jornal do Comércio