O país deixou de ser visto como apenas parte da América Latina para ganhar uma agenda que deve ampliar os investimentos no país, segundo Gabriel Rico, presidente da Amcham.
Nem bem a secretária de Estado Hillary Clinton havia anunciado a criação de mais dois consulados dos Estados Unidos no Brasil e já falava, pela primeira vez em muito tempo, no estabelecimento do livre comércio entre os dois países.
Os fatos sinalizam a aproximação Brasil-EUA que deve ainda se
intensificar e trazer mais investimentos da iniciativa privada para cá –
e levar produtos brasileiros para lá. “Nunca houve uma convergência de
fatores tão favoráveis”, afirma Gabriel Rico, presidente da Câmara de
Comércio Brasil-Estados Unidos (Amcham). Ele diz que a eliminação de
vistos para turistas brasileiros em viagem ao território americano e de
barreiras para a entrada de produtos não devem acontecer muito
rapidamente, mas vão se concretizar no médio prazo. “É algo que não há
como discutir”, diz.
Também inevitável é a marcha de companhias americanas rumo ao Brasil.
“Nenhuma grande empresa no mundo pode se dar ao luxo de ficar fora do
mercado brasileiro. Afeta a valorização da própria companhia”, afirma
Rico.
Em seu papel de promotora dos bons negócios entre as duas nações, a
Amcham tem publicado guias “How to Invest in Brazil”, que permitem a
empresários estrangeiros entender a dinâmica da economia nacional e os
entraves burocráticos na criação de uma filial. O próximo a ser lançado é
do Paraná, mas o Estado não está sozinho nos esforços para atrair a
atenção, principalmente dos empreendedores americanos. “Temos trabalhado
muito com o governo e empresários do Pernambuco”, diz Rico. “A região
de Suape cresce em um ritmo Também inevitável é a marcha de companhias americanas rumo ao Brasil.
“Nenhuma grande empresa no mundo pode se dar ao luxo de ficar fora do
mercado brasileiro. Afeta a valorização da própria companhia”, afirma
Rico. Em seu papel de promotora dos bons negócios entre as duas nações, a
Amcham tem publicado guias “How to Invest in Brazil”, que permitem a
empresários estrangeiros entender a dinâmica da economia nacional e os
entraves burocráticos na criação de uma filial. O próximo a ser lançado é
do Paraná, mas o Estado não está sozinho nos esforços para atrair a
atenção, principalmente dos empreendedores americanos. “Temos trabalhado
muito com o governo e empresários do Pernambuco”, diz Rico. “A região
de Suape cresce em um ritmo acima da China”.
A comparação com o crescimento chinês permeia muitas análises do Fundo
Monetário Internacional e do Banco Mundial. Mas as instituições se
esquecem muitas vezes de apresentar as vantagens que colocariam o Brasil
em uma situação mais favorável que os outros Brics. “Temos divulgado
esses diferenciais competitivos, que são importantes na definição de
investimentos no Brasil”, diz Gabriel Rico. Entre eles estão o
crescimento da classe média e o fato de o país ter uma sociedade
multirracial e multicultural. Nada de ruim? “O nosso calcanhar de
Aquiles é a perda de competitividade, o custo Brasil, que afetam
inclusive nossa infraestrutura”, afirma. Sem esses problemas, o
investimento de empresas americanas seria ainda maior. “Se não
tivéssemos esses gargalos, estaríamos crescendo em ritmo chinês, próximo
dos dois dígitos”.
Existe uma percepção hoje de que o Brasil tornou-se um país
muito mais importante na agenda dos Estados Unidos. Para quem acompanhou
a visita da presidente Dilma a Washington, poderia nos dizer se essa
percepção é verdadeira?
É isso mesmo. A visita do presidente Barack Obama há um ano foi um
marco nas relações do Brasil com os Estados Unidos e sinalizou o início
de uma nova fase. Até então, as políticas norte-americanas eram voltadas
para a América Latina e o Brasil fazia parte delas. A partir dali ficou
evidente que o Brasil passou a ter uma agenda bilateral, sinalizando um
relacionamento mais profundo e complexo. Há pouco tivemos a visita da
presidente Dilma a Washington. E por fim, a visita da secretária de
Estado Hillary Clinton e do secretário do interior, Kenneth Salazar. O
ministro Fernando Pimentel disse muito que a relação com os EUA
transcende o aspecto comercial e envolve o setor privado – que a própria
presidente Dilma destacou como crítico nesse relacionamento. Se isso
não bastasse, este ano teremos dois milhões de brasileiros viajando aos
EUA. É um destino aspiracional da classe média brasileira. Hoje
começamos a comprar ainda mais o soft power (a habilidade de atrair em vez de coagir) americano e o Brasil passa a vender o soft power brasileiro.
E esse aprofundamento de relações tem reflexos diretos no aumento de empresas americanas no país?
Aqui na Amcham recebemos de 20 a 30 empresas por mês procurando
informações de como fazer negócios no Brasil. Para isso já temos 20
publicações, os guias “How to do Business in Brazil” com vários
aspectos, como a instalação de uma empresa. Com a reestruturação
socioeconômica no Brasil, que ampliou a sociedade de consumo, o
interesse por investir no país naturalmente deve crescer. Somado a isso
há um momento propício em que as grandes empresas americanas,
especialmente, vivem uma fase de alta liquidez. Então, o Brasil tem
mercado, tem relações diplomáticas favoráveis e as companhias têm
dinheiro para investir.
O Brasil também tem juros altos, problemas de câmbio e uma carga tributária que, segundo a Fiesp, prejudicam os investimentos.
Se não tivéssemos esses gargalos, estaríamos crescendo em ritmo chinês,
próximo dos dois dígitos. Somos um país que se encaminha para os 200
milhões de habitantes [dados do Censo indicam que o país tinha 192
milhões em 2010] que há oito anos tinha cerca de 42% da população no
mercado de consumo. Hoje esse número está em 75%, com maiores salários e
mais crédito. É um aumento tão grande que estamos consumindo o que
produzimos aqui e o que importamos. Nenhuma grande empresa no mundo pode
se dar ao luxo de ficar fora do mercado brasileiro. Ter uma posição
forte no Brasil é importante para a avaliação de qualquer grande empresa
mundial. À medida que elas se instalam aqui, o país se torna mais e
mais o centro dinâmico da América Latina.
O nosso calcanhar de Aquiles é a infraestrutura?
O nosso calcanhar de Aquiles é a perda de competitividade, o Custo
Brasil. A infraesturutra representa uma parte desse conjunto. No ano
passado, a Amcham promoveu 11 seminários sobre competitividade, em
caráter nacional e depois regionalmente, no Paraná, em Minas, Recife,
Brasília. É preciso recuperar o quanto antes essa condição. Como o
Brasil não tem nível adequado de poupança, a participação do
investimento estrangeiro direto (IED) é fundamental.
Tem algum gargalo para as empresas brasileiras que querem investir nos EUA?
Não na entrada, mas na fase seguinte, pois não temos acordo de
bitributação. Quando as empresas precisam repatriar dividendos, a
taxação é muito alta. Agora esse assunto volta a ser prioritário nas
relações entre os dois países, após 40 anos na pauta. A secretária
Hillary Clinton citou em seu discurso que deveríamos pensar no acordo de
livre comércio. Acredito que isso seja algo para médio prazo.
De quantos anos estamos falando? Dez anos?
Não é algo que vai se resolver em um ano, mas acredito que bem menos do
que dez anos. Eu vejo a possibilidade de um acordo de livre comércio na
mesma proporção que a eliminação de vistos entre os dois países. Não há
como ignorar. Os EUA estão aumentando o número de consulados para
concessão de vistos. Dois milhões de brasileiros devem visitar o país,
daqui a pouco serão três milhões. Não vamos nos esquecer que os
subsídios – a questão do algodão, da laranja, da carne suína –
constituem um ruído na comunicação com os EUA e vêm sendo resolvidos
pontualmente. Existe um protecionismo no mercado americano, muito mais
em função de políticas regionais, que custa caro. O governo Obama está
direcionando sua atenção para a eliminação desses subsídios. E este é um
ponto importante para o Brasil ter entrada no mercado americano e
crescer principalmente no setor agropecuário. Os EUA podem entrar com
fluxo de tecnologia de ponta, então começamos a falar de interesses que
no conjunto podem se harmonizar.
Em quanto tempo o Brasil deveria resolver a questão da perda de
competitividade para que o país não deixe de aproveitar o bom momento?
O Brasil atua em dois eixos. Um eixo envolve o protecionismo, ou seja, o
país está se defendendo das próprias deficiências e das vantagens
competitivas de outros países. O governo tenta defender setores
específicos da economia brasileira, mas nós sabemos que esse é um
remédio de curto prazo. A solução de longo prazo envolve mudanças
estruturais, que passam por investimento estrangeiro, de qualidade,
capaz de trazer inovação, tecnologia e aumentar a produtividade. E não
tem outro país que possa fazer isso como os EUA.
A que setores pertencem as empresas americanas que têm mostrado interesse em vir ao Brasil?
Em primeiro lugar há um aumento dos investimentos das empresas
americanas que já estão no Brasil. Em relação as que estão analisando o
mercado, vemos um interesse de empresas que operam em nanotecnologia,
biotecnologia, na área de energia, óleo e gás, no campo de etanol, com
aplicação de tecnologias mais avançadas. Há muito interesse por parte de
companhias da área de alimentos e de informática. Sem falar em empresas
que têm interesse nos projetos dos jogos, com tecnologias como vending
machines que preparam as bebidas. Alguns desses acordos para a Copa já
estão sendo fechados.
Quais são os Estados que têm feito um esforço maior para atrair as empresas americanas?
O programa da Invest SP, uma empresa montada para orientar
investimentos em São Paulo, é um trabalho bastante profissional e tem
trazido bilhões de dólares num prazo relativamente curto. Pernambuco tem
feito um esforço grande e a região de Suape cresce em um ritmo acima da
China. A área ao redor do porto congrega indústria naval, um centro
industrial, um pólo logístico e um centro de desenvolvimento de
tecnologia, complementados por hotéis nos mesmos padrões de Miami. Tem o
governo do Paraná, com o qual faremos um “How to Invest”, Minas Gerais
e, claro, por questões óbvias, o Rio de Janeiro que vive um momento
muito favorável.
Como é possível mostrar aos investidores americanos que nosso crescimento regional é sólido?
É um trabalho contínuo, que passa pelos números. A economia brasileira
representa cerca de 3% do PIB mundial. A participação do Brasil no
comércio internacional é de 1,3%. Isso mostra como somos ainda uma
economia fechada. Durante muitos anos tivemos um comportamento um tanto
provinciano. Está na hora de correr atrás para formar mão de obra
qualificada que nos falta. Com tudo isso, a internacionalização do
Brasil é um fenômeno que essa geração jovem vai vivenciar por toda a
vida.
Há quem diga que ainda temos muito a fazer para ultrapassar a
síndrome do vira-lata e provar que o Brasil não tem apenas potencial,
que pode representar um papel importante na economia mundial.
Queira ou não, esse momento chegou. Em todos os assuntos relevantes da
agenda internacional, seja G-20 ou da Organização Mundial do Comércio
(OMC), o Brasil não tem mais como se esconder dos grandes temas. Estamos
falando de um país que está apenas atrás dos EUA como maior produtor de
alimento do mundo [dados da Embrapa projetam que o país ocupará o primeiro lugar até 2020],
que tem 12% das reservas de água potável do mundo, 3% da população
mundial, 30% do carbono florestal e ocupa da primeira à quinta posição
no ranking dos 17 minerais mais comercializados. É um país com matriz
energética incrível, plataforma econômica e industrial forte e que pode
se tornar um dos maiores produtores e exportadores de petróleo. A
importância geopolítica do Brasil também cresceu muito. Mas somos novos.
O Brasil faz parte dos países Bric, mas sua participação na história
mundial é muito recente. O Brasil é um adolescente no cenário
internacional. E como tal, acha que por ter 1,90 m de altura já é
adulto. Há muitos pontos que precisarão ser lapidados, mas isso é parte
da nossa evolução.
Com quem o Brasil deveria tomar uma lição rápida para crescer?
Coreia do Sul, o país promoveu a maior revolução educacional, talvez da história,
instituiu um programa de construção de grandes empresas para competir
mundialmente e ao mesmo tempo em que se estruturou e fortaleceu sua
economia, escolheu a hora certa para fazer um acordo de livre comércio
com os EUA. Tudo muito rápido. Nos anos 1950, a Coreia do Sul não era
nada. É o maior exemplo para o Brasil.
Resumo da história: o Brasil precisa fazer sua lição, correr atrás do desenvolvimento e olhar para a Coreia.
Nunca houve uma convergência de fatores tão favoráveis ao país. A gente
aqui diz que o Brasil vivencia três viradas que acontecem ao mesmo
tempo. A primeira é a macroeconômica, em que o Brasil deixa de correr
atrás do FMI para renovar empréstimos e passa a ser credor, com US$ 300
bilhões em investimento direto estrangeiro e reservas internas de mais
de US$ 350 bilhões. A segunda é a virada socioeconômica, com a
incorporação de 50 milhões de brasileiros na sociedade de consumo [48,8 milhões migraram para as classes A, B e C desde 2003 até maio de 2011, segundo a FGV]
desde 2003. E a terceira é a conquista da importância geopolítica, por
todas as condições que tivemos ao longo da história e que agora o mundo
inteiro está conhecendo.
Fonte: Época Negócios