quinta-feira, 26 de janeiro de 2012

A criação de um novo Suape

O governo de Pernambuco tenta repetir em Goiana, no carente litoral norte do Estado, o sucesso do polo industrial e logístico construído ao redor do porto de Suape.

Localizado no litoral norte de Pernambuco, o pouco conhecido município de Goiana, de 75 000 habitantes, começa a se preparar para o que deverá ser a transformação mais importante de sua história. Cidade pobre da Zona da Mata pernambucana, na divisa com a Paraíba, Goiana receberá uma nova fábrica da Fiat no Brasil.

Com capacidade para produzir anualmente 250 000 veículos, o complexo deve incluir centro de pesquisa e pista de testes, a segunda da montadora no mundo — a outra fica na Itália.

A fábrica da Fiat, com previsão de consumir investimentos de 4 bilhões de reais e gerar 3 500 empregos diretos, deverá ser apenas o início das mudanças no norte de Pernambuco.

O governo do estado trabalha para transformar a região em uma espécie de novo Suape, o polo industrial erguido no sul do estado a partir da construção de um grande porto marítimo. Suape atraiu mais de uma centena de empresas para Pernambuco.

A companhia de engenharia Promon está em fase final de estudos de viabilidade de uma área em Goiana para abrigar um cais que tenha condições de receber grandes navios.

“A profundidade parece adequada e o canal é bastante protegido, o que dispensa a construção de uma obra cara como um quebra-mar”, diz Paulo Sobreira, diretor comercial da Promon.

Se tudo ocorrer dentro do cronograma previsto, ainda no início de 2012 deverá ser feita a licitação do novo porto. A previsão é que as obras estejam concluídas no início de 2015.

Além da criação do porto, o governo pernambucano anunciou melhorias viárias. Será construída uma via expressa para ligar a Região Norte ao porto de Suape, contornando a área metropolitana de Recife. A atual rodovia BR-101, que une Goiana ao sul de Pernambuco, passando pela capital, está sendo duplicada.
O governo quer repetir em Goiana a receita de sucesso de Suape. Lá, o investimento em infraestrutura foi decisivo para a conclusão do porto, iniciado na década de 70, e para a transformação do entorno em polo industrial. A ideia também é aproveitar as lições dos erros cometidos em Suape para evitar novos problemas.

Para atender ao crescimento populacional que deve ocorrer em Goiana, um bairro com até 10 000 casas deve ser erguido em uma área do governo do estado. Outro terreno foi doado ao programa Minha Casa, Minha Vida, mirando a construção de mais 10 000 residências populares.
Na vizinhança de Suape praticamente não há casas. O resultado é que a maioria dos trabalhadores mora longe e gasta muito tempo na locomoção de casa para o porto. O percurso de Recife a Suape, de 60 quilômetros, leva normalmente 2 horas.

“Esses problemas e a alta demanda fizeram com que os salários em Suape subissem muito nos últimos anos”, diz Jorge Jatobá, sócio da empresa de consultoria Ceplan e ex-secretário da Fazenda de Pernambuco.

Migração para o norte

Foi em busca da estrutura que começa a ser erguida no norte do estado e para fugir dos custos crescentes de Suape que a Fiat e uma dezena de empresas menores decidiram migrar para Goiana e cidades vizinhas.
A montadora italiana já havia escolhido terrenos em Suape e até anunciou a construção de sua segunda fábrica brasileira no polo, no final do ano passado.
Em julho deste ano, depois de conhecer Goiana, os executivos da Fiat mudaram de ideia. “Em Suape, além do trânsito intenso e da competição por mão de obra, não havia um terreno grande o suficiente para abrigar todo o nosso complexo. Teríamos de usar três áreas separadas”, diz o argentino Pablo Disi, vice-presidente financeiro da Fiat para a América Latina.

“Em Goiana, conseguimos uma área para construir a fábrica, o centro de desenvolvimento e a pista de testes juntos.” Para se instalar no norte pernambucano, a Fiat recebeu os mesmos incentivos que teria se fosse para Suape: terreno grátis e isenção de 95% do imposto sobre circulação de mercadorias e serviços por 12 anos. A previsão da Fiat é começar a montar carros em Goiana em 2014.

Em torno da montadora poderão se instalar dezenas de empresas. “Há um compromisso para que 16 fornecedoras acompanhem a Fiat e que outros 24 cheguem até 2015”, diz Eduardo Campos, governador de Pernambuco. “Mas já conversamos com mais de 100 companhias interessadas em construir fábricas na cidade.”

A infraestrutura que começa a ser erguida e a perspectiva de transformação da região num polo industrial já atraíram alguns negócios para o local. Cerca de dez companhias do setor farmacêutico anunciaram investimentos em Goiana nos últimos meses.

O grupo Cornélio Brennand, um dos maiores de Pernambuco, começou a construir duas fábricas na cidade, uma de vidros planos, para atender o setor de construção civil, e outra de vidros automotivos, que deverá fornecer para a Fiat. Só os investimentos do Brennand superam 600 milhões de reais e deverão gerar 500 empregos diretos.

Na vizinha Itapissuma, a Ambev constrói aquela que deverá ser sua segunda maior fábrica no país. A empresa comunicou inicialmente o investimento de 260 milhões de reais na unidade, que deverá começar a operar neste mês.

Mas, antes mesmo da conclusão das obras, decidiu ampliar o aporte para 400 milhões de reais e dobrou o número de empregos gerados de 200 para 400.
A capacidade de produção, de 500 milhões de litros por ano, passou para 850 milhões. Oficialmente, a Ambev não confirma, mas pessoas próximas à direção da empresa dizem que haverá mais um anúncio de ampliação para duplicar a capacidade de produção.

“Pernambuco tinha as condições perfeitas para abrigar a nova fábrica, porque está no centro do Nordeste, que é a região onde o consumo mais cresce no país”, diz Márcio Fróes, vice-presidente de suprimento da Ambev. “E o norte de Pernambuco, com boa infraestrutura, área plana e água em abundância, é ideal.”

A chegada das empresas começou a mudar a vida das cidades do norte pernambucano. A Fiat e a Ambev investem em formação profissional para contar com funcionários da região. A Ambev fez uma parceria com o Senai para treinar todos os empregados pelo menos por dois meses.

A Fiat, em parceria com o governo, terá cursos em uma escola técnica em Goiana e intermediou um acordo entre a Universidade Estadual de Pernambuco e a Universidade de Turim para que 40 alunos se especializem em engenharia automotiva na Itália.

As plantações de cana-de-açúcar, base histórica da atividade econômica da região, começam a dar lugar a fábricas, e já há planos para a construção de hotéis e de um aeroporto.

Goiana e suas vizinhas devem agora ingressar na lista de polos econômicos de Pernambuco, criados com base em investimentos em infraestrutura e na continuidade de projetos, independentemente do partido de plantão no governo. A lista tem à frente Suape, com sua refinaria de petróleo, estaleiros e indústrias.

Recife viu os setores de serviços e de imóveis disparar nos últimos anos. No sertão, Salgueiro começa a se transformar em centro logístico da Região Nordeste. E Petrolina, com a agricultura irrigada, é uma das principais produtoras de frutas e vinho do país.

Como resultado da atração de empresas e investimentos, Pernambuco se livrou de alguns dos piores índices socioeconômicos do país, como a maior taxa de homicídios e o pior desempenho entre alunos do ensino médio. Sua taxa de desemprego caiu de 15% para 6% em seis anos.

A economia do estado cresceu 9,3% no ano passado, bem acima da média nacional, de 7,5%, e mais do que a média dos principais estados vizinhos. Com mais um polo de produção, Pernambuco amplia a chance de se manter na rota do ­desenvolvimento.

Fonte: Exame

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