Há mais de 20 anos o italiano Nicola Minervini tenta ensinar micro e
pequenas empresas (MPEs) em todo o mundo a exportar. Na internet, as
dicas do engenheiro-eletrônico e economista podem ser assistidas em
vídeos no YouTube, que costumam frisar gafes cometidas por MPEs no
exterior. “Muitas que têm ido seria melhor que não fossem, pois só
pioram a imagem da marca Brasil”, adverte. Autor do livro O Exportador, que
está na sexta edição, Minervini esteve recentemente no Brasil e tentou
“chacoalhar” o empresariado, em palestras na Serra gaúcha e região
calçadista. O especialista propôs a criação de consórcios para exportar e
avisou que não adianta ficar só lamentando o Custo Brasil.
”Infelizmente muitos ficam esperando que toquem a sua campainha em vez
de arrombar a porta alheia.”
Jornal do Comércio - A crise mundial é obstáculo a quem quer começar a exportar?
Jornal do Comércio - A crise mundial é obstáculo a quem quer começar a exportar?
Nicola Minervini - É
ótima oportunidade para médias e grandes empresas, que poderão até
comprar operações no Exterior. O Brasil também tem sido alvo de
investimentos de estrangeiros, que abre espaço para alianças e acesso à
tecnologia. Vemos micro e pequenas empresas indo a feiras e missões no
exterior sem preparo algum para vender, entender as exigências e a
capacidade de produzir para exportar. Muitas não conseguem fazer frente
nem à concorrência de grupos de fora no mercado interno. Precisa ter
competitividade para se internacionalizar.
JC - Ter experiência internacional também ajuda na briga interna?
Minervini -
Se exportar para a Colômbia, perturbo o futuro exportador que venha
para cá. Se me internacionalizo, posso melhorar meu produto e a forma de
gestar a empresa, o que me beneficia internamente.
JC - Por que o Brasil não sai de 1,5% a 2% das exportações no mundo?
Minervini -
Falta muita cultura exportadora aos brasileiros. Por isso, as empresas
são eternamente escravas do câmbio e do Custo Brasil. Insisto em
palestras e artigos de opinião para que os empresários deixem de lado os
problemas que levarão gerações para serem resolvidos e foquem o negócio
agora.
JC - E qual é a reação a sua provocação?
Minervini -
Infelizmente, muitos ficam esperando que toquem a sua campainha em vez
de arrombar a porta alheia. O raciocínio é: enquanto tem demanda
interna, por que vamos olhar para fora? Para exportar, precisa ter
competitividade intrínseca. Se não tiver P&D, uma empresa não vende
produtos, mesmo se estiver no melhor país do mundo. Será que não estamos
nos entrincheirando atrás do Custo Brasil em vez de dar uma chacoalhada
no negócio para compensar esta desvantagem? Enquanto isso, os asiáticos
avançam sobre um espaço cada vez maior. Alguns falam que a saída é
aumentar de tamanho e investir em nichos, isso é poesia. O caminho é
formar sistemas integrados de promoção à competitividade.
JC - Como funciona este modelo?
Minervini -
Baseia-se na formação de consórcios de exportação. Quando se fala neste
modelo, a reação é negativa e de resistência. Muitas experiências não
deram certo porque quiseram adotar a receita italiana, que é outra
realidade. Lá as empresas não exportam a granel, vendem design e
tecnologia. Decidi tropicalizar a ideia criando o Sistema Integral de
Promoção da Exportação (Sipe), que foi implantado pela Assintecal
(Associação das Indústrias de Componentes e Partes de Calçados).
Funciona bem há dez anos, mas é preciso vencer o individualismo e a
desconfiança. O maior erro é pensar que limita-se a um consórcio de
vendas. Tem de ser um grupo para acessar instrumentos de design,
tecnologia, matéria-prima e componentes. Uma pequena empresa de móveis
não pode pagar um projetista italiano, mas seis podem. Só assim micro e
pequenas empresas conseguirão exportar. Na Itália, estes dois segmentos
respondem por 75% do comércio externo.
JC - Quais foram os resultados para as associadas da Assintecal?
Minervini -
A criação do Sipe levou o grupo a se desenvolver, ter central de
distribuição, reduzir fretes, contratar designers, consultoria fiscal e
de marketing. O conceito é ver o que podem fazer em conjunto e o que
cada um faz individualmente. O grupo descobre que tem muita coisa em
comum. A Assintecal criou o By Brasil, que está levando o nome das
empresas ao exterior.
JC - Quanto o Brasil pode ampliar as vendas se as pequenas se mexerem?
Minervini -
Disse a 600 pessoas em uma palestra em Caxias do Sul que é preciso
fazer algo urgente, porque a pequena e a média empresa estão espremidas
entre as grandes multinacionais e os chineses. Mas muitas que têm ido ao
exterior seria melhor que não fossem, pois só pioram a imagem da marca
Brasil. Antes de ir, o empreendedor deve ter projeto de competitividade.
Quem vende em quitanda, tem primeiro de vender a um mercado maior em
sua cidade. Só quem tem design e tecnologia, repito, deve ir para fora.
Além disso, deve-se aumentar a pauta de exportação e avaliar a
capacidade de vender.
JC - Faltam mais incentivos do governo?
Minervini -
Para ajudar as empresas, qualquer governo deve reduzir o tempo para
obter patentes dos produtos. Aqui se leva oito anos. Também pode
incentivar a formação de grupos de exportação, além, claro, de reduzir o
Custo Brasil e a burocracia.
JC - Quais são os erros mais comuns que o senhor alerta no seu livro O Exportador?
Minervini –
Levaria dois dias para listar todos. Mas alguns posso indicar. Nunca vá
a uma feira como expositor se não conhece o local nem como visitante -
você pode descobrir que errou de feira. Exportar não é saída para a
crise, é antídoto. Pergunte-se por que quer exportar - se for apenas
para faturar mais, está errado, deve ser para crescer. Indague-se: estou
exportando ou os importadores estão comprando? Muitas vezes você está
apenas administrando pedidos e pode ser facilmente trocado por outro
fornecedor.
JC - Quantas empresas seguem seus conselhos?
Minervini -
Muitos vão às palestras e esperam que eu malhe o governo. Eu malho a
plateia (no bom sentido). Mando olhar se registrou a marca, como está o
catálogo do produto. Cuidar a comunicação é fundamental. Nunca comece a
apresentação pela história da empresa. O que interessa ao importador é o
benefício do produto. Tem de investir em um departamento de comércio
exterior, com um profissional que gerencie a área. E importante, é mais
difícil vender a ideia de exportação dentro da empresa do que lá fora.
Se não tem cultura, não adianta ter um executivo para o setor. Portanto,
tem de sensibilizar todos os funcionários para exportar, dos mais
humildes aos de postos superiores.
JC- Onde estão as oportunidades para vender?
Minervini -
Um rapaz veio e me disse que queria exportar para a China. Lembrei a
ele que o país asiático compra 5 milhões de peças. Não adianta se você
produz só 4 mil. Lá é outro planeta, outra cultura. Por que não tenta
vender aqui na esquina, ao Uruguai, e para o restante da América Latina?
Depois de aprender a se relacionar comercialmente perto, pode pensar em
ir à Europa, aos Estados Unidos ou a nações árabes.
Fonte: Jornal do Comércio, por Patrícia Comunello
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